domingo, 29 de outubro de 2023

Aqui Há Dragões!

Dragões como opção de personagem já é ideia antiga. Da relação (incompleta) abaixo em que eles são uma possibilidade de player character, eu já joguei Castle FalkensteinFireborn, Defiant e um homebrew na época chamado Dragon: The Waking Wrath. Vamos a eles:

Rifts (1990): um dos RPGs veteranos da lista e conhecido pelo cenário, huh, hiperbólico, é até normal que se esperasse ter dragões como uma opção de pc. Aqui, um dragão é uma criatura descrita como extremamente poderosa no cenário - mesmo para este cenário em si. Eles vivem e transitam pelos diversos universos do que é chamado de Megaverso (antes de multiverso virar palavra de ordem, hoje em dia), e mais com o jeito das descrições tradicionais de egoísmo e ganância, pouco afeitos a formar comunidades e lembrar de sua sua própria História, vivendo mais para saciar curiosidades, gostos e vontades, ainda que não necessariamente a curto prazo. O Dragon Hatchling é a forma que chegaram para colocá-los como opção de jogo, e ao menos na Ultimate Edition (2005) do jogo,  apresentando meia dúzia de subespécies para se montar um personagem.

Surtado RPG. Quem conhece, sabe.

Council of Wyrms (Wizards of the Coast, 1993): em um cenário próprio para AD&D (2e) - Io's Blood Isles -, os dragões típicos do jogo (cromáticos, metálicos e gem) esquematizam sua política e travam suas guerras, sendo personagens jogáveis. Não havia ainda a raça jogável dos Dragonborne, mas  sim opções para Half-Dragons eram apresentadas, quando um dos pais era um dragão e outro era de uma das raças humanoides jogadoras.

Confesso que não sabia que era um cenário próprio, como Greyhawk ou Forgotten Realms.

Castle Falkenstein (RTG, 1994): o Pterodraconis sapiens é um "dragão científico", nas palavras de Tom Olan, narrador personagem do corebook. Isto significa descender e evoluir dos pterodátilos de dezenas de milhões de anos atrás, graças a uma subespécie de então, com propensão natural à magia e alguma inteligência rudimentar, que conseguiu sobreviver ao meteoro que extinguiu os dinossauros há 65 milhões de anos. Em vez de serem as criaturas titânicas de outros jogos, aqui eles nem são tão grandes assim (os maiores exemplares pesando 180 kg, com 7 metros de comprimento e 15 de asa),  também possuindo ossos ocos, o que ajuda na sustentação do ar.

O que não significa que não devam ser menos temidos: sopro de fogo e habilidade de feitiçaria (foram os primeiros professores de magia dos seres humanos, na mais remota Antiguidade) estão em seu arsenal.

Mas dragões falkensteinianos são civilizados, desfrutando das benesses da moderna sociedade vitoriana, e apoiadores do Segundo Compacto, o que reduz bastante o conflito - não obstante vilas sendo acossadas atrás de virgens para desposar, rebanho sendo apenas tomado para uma refeição, entre outros eventos desafortunados de eras menos iluminadas...

Recentemente, saiu no Brasil pela Retropunk.

Lorde Vermithrax deixa claro alguns pontos de vista para o arquimago Grey Morrolan.

Changeling - The Lost (Onyx Path 2a ed. em 2019), apresenta, no módulo Kith and Kin, o kith chamado Draconic, com as características e o temperamento de autêntico dragão, entre a fúria e a avareza. Apesar de tudo, podem ser bons companheiros, resguardando seus amigos de ameaças assim como sua Toca - afinal, dragões protegem muito bem tudo o que é seu.

No Brasil, a Devir lançou a primeira edição como Changeling - Os Perdidos.

Dragon - the Waking Wrath: mais pela chance de falar do mítico site B. J. Zanzibar World of Darkness do que do jogo em si, eu joguei a versão original (descobri ainda agora haver uma 2a.) quando publicada na época, lá por 99/00. A ideia é um cenário com regras feito por um fã, incluindo dragões que despertam próximos ao fim dos tempos, no Mundo das Trevas (então ainda da White Wolf).

Fireborn (FFG, 2002): um jogo de fantasia urbana e fantasia épica ao mesmo tempo: houve uma Era Mítica em que a realidade seguia outras regras, possibilitando tudo aquilo que a Humanidade se lembra distorcido e chama de mitologia - especialmente no que diz respeito a dragões, até que um evento cataclísmico sugou a magia do mundo. Atualmente, na Londres moderna (de uns 20 anos atrás, mas, enfim) a magia, por motivos desconhecidos, retorna aos poucos, mas criaturas mágicas, reencarnadas como humanos, começam a se lembrar de Antes: dragões incluído. 

A mecânica do jogo traz hoje em dia, em que você monta uma ficha de um humano com suas habilidades próprias e poderes herdados de uma outra época, e uma segunda ficha em que você monta o dragão que um dia você foi, no auge de sua existência: e você joga tanto agora quanto em momentos de flashback.

Vários tipos de dragões diferentes são contemplados, cada um com suas vantagens e bônus: dragões, serpes, vermes, etc.

Draconomicon (Wizards of the Coast, 2003): Para a 3a. edição de D&D, "o Livro dos Dragões" detalha estes seres no jogo, além de oferecer a opção de raça jogadora. D&D também traz a raça de jogo dos Dragonborne, humanoides de origem dragontina.

Defiant - Awakening (Game Machinery, 2020), que tenho um jogo em andamento comentado aqui, joga-se como seres que comandam a sociedade mundana, e uma das opções são dragões, ou Leviathans. Três linhagens de sangue são fornecidas, a Casa Hadad, que são dragões da tempestade refletindo seu temperamento, Casa Melqart, dragões da terra e senhores de seus tesouros, e Casa Shemesh, os dragões do fogo, de temperamento ainda mais difícil e que traíram o Apocalipse que originalmente deveriam servir, entrando em uma difícil aliança com os poderes que se opõem ao fim do mundo.

À mesa de negociações com um leviatã - ou um demônio. Vai que.

Infelizmente, dentro dos jogos que já tive ou tenho um dragão, nenhum nunca durou muito tempo. Retomei Defiant recentemente com o mesmo personagem, vamos ver. Segue agora um pouco das impressões que tive ao jogar:

Castle Falkenstein, o sistema que, de longe, tenho maior familiaridade: o personagem dragão que cheguei a fazer repeti, pelo menos em nome, em dois jogos diferentes, um play by email que a morte dos yahoogroups engoliu, embora o jogo tivesse murchado muito antes; e umas sessões com um arco que, salvo engano, chegou a fechar, para bem ou para mal.

Dragões, como feiticeiros natos, têm uma limitação natural para o acúmulo de energia que os humanos não têm, embora consigam manipular a magia de forma muito mais livre do que seres humanos, que têm que aprender feitiço por feitiço. Nunca cheguei a testar as regras de magia, dos dois lados do screen, em  toda sua extensão, embora tenha viso em primeira mão o uso de um Coringa no baralho de feitiçaria - e o desastre que ocorreu poderia acontecer tanto se, em vez de um dragão, meu personagem fosse um mago. Dragões falkensteinianos podem fornecer muita diversão, especialmente nas mãos de um jogador criativo.

Fireborn: é um dos jogos onde o tema é ser, jogar com um dragão. Infelizmente só jogamos uma vez, embora houvesse encontros virtuais para montagem do personagem. O resultado, por mais que fosse breve, foi um dos mais divertidos que conheci, e a proposta de jogar em duas épocas - onde você tem a oportunidade de entender que um dragão, apesar de tanto poder, ainda não é o tubarão dentro desse aquário... - remete direto à transição de períodos de tempo no filme Highlander. O segundo período, o mítico, ocorre quando o GM quer uma memória desbloqueada do personagem moderno, e é mais do que uma memória de uma pessoa, o círculo de dragões é envolvido de maneira mística. Sendo que, o resultado lá tá valendo: em caso de morte de  um personagem na era mítica, fica claro para todos como foi o glorioso (espera-se) fim do poderoso dragão Tempestorr do Relâmpago Vingativo: que o inferno estremeça ante sua chegada. É possível jogar, também, uma campanha somente na Era Mítica.

Meu personagem é alguém que, montado nas regras de template, é um paciente de sanatório internado por sua rica família pelos excessos de personalidade desagradável e estranhas visões de um mundo de fantasia, encontrando o motivo justo para dispensar um potencial competidor na herança da família. Na Era Mítica, ele era um grande ocultista. As personalidade de agora reflete a de antigamente (embora não seja mandatório): em um exemplo simples, um policial ou soldado de hoje em dia pode ter sido um dragão que jurou aliar-se para a proteção de algum reino.

Dragon: the Waking Wrath: no início, nosso GM pulou a parte do lore que dizia que, assim como qualquer criatura mágica do Mundo das Trevas, os dragões que despertavam procuravam se esconder - e nós saímos por aí fazendo miséria. Porta-aviões como prancha de surf em um tsunami atingindo Londres? Por que não? Transformar o teto da chantry Tremere em vidro durante o dia? Bora. No segundo jogo em diante (acho que foram três ou quatro sessões), a parte de ter que se esconder se oficializou, e as coisas não ficaram tão divertidas - por mais que fizessem sentido, pois se, afinal, você é o tubarão no aquário, provavelmente tem um mega-arpão explosivo sendo apontado pra você. Do que eu lembre, rolamos poucos dados para a magia (lembra um pouco a mecânica de Arts + Realm de Changeling - o Sonhar ou verbo e objeto de Ars Magica), mas os efeitos podem ser meio devastadores. É um jogo que poderia falar facilmente com as linhas históricas do MdT, dado a questão da longevidade dos bichos. 

Meu personagem lembro que se chamava Granamir - ainda que sem um bárbaro de tanguinha felpuda andando por aí -, era um ocultista entre os dragões, com planos de poder que infelizmente deram com os burros n'água.

Defiant: até onde vi, os Poderes que Valem na sociedade não necessariamente têm mais vantagem do que os outros, sendo tudo um grande equilíbrio de forças entre as 4 Grandes Casas: dragões, deuses, demônios e anjos; sendo todos devoráveis por igual por aquilo que perambula fora das cidades. Os personagens, claro, podem se destacar.

Lorde Hades Melqart é meu personagem, seguindo os temas de The Primordial, The Shadow e The Socialite. Suas características em geral o deixam um fofoqueiro dos infernos, e sua coleção de vinhos caros advém da Adega que administra e supre os bons hotéis e restaurantes da cidade, assim como as boas festas da Corte - ou assim quer que pensem, pois sua verdadeira coleção, de livros da Antiguidade, foi espalhada e repartida pelos assassinos de seu antigo eu, muitos ainda por aí. Vingança é um prato melhor servido frio.

***

Uma conclusão precipitada, pois julgo que nunca joguei nada realmente a contento, é que, em comum, jogos onde dragões são uma viabilidade tendem tanto a respeitar o poderio dos próprios, face a outros elementos do cenário, mas, em nome do desafio sempre necessário em um RPG, isso não quer dizer que sejam, de fato, as piores coisas existentes: a graça está, claro, nas nuances de cada cenário apresentado nos jogos, assim como as opções de personagem dragão e, no final e como sempre, o personagem que você monta.

O acúmulo insano de riquezas associado a estes seres é substituído, ao menos em dois casos, por uma coleção de itens temáticos não necessariamente valiosos financeiramente, mas que dizem respeito ao dragão que a detém: em CF, isso tem a ver com a Memória Racial da espécie, e em D:A, simboliza parte de seu status. Em ambos os casos, obviamente que dragões são absurdamente zelosos de suas coleções. 

Foi divertido compor esse post. Ocasionalmente devo reeditá-lo, na medida em que mais repertório for sendo acrescido, para o que já falei e o que passei a conhecer.

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